sexta-feira, 10 de junho de 2016

UMA CIDADE E O SEU MUSEU: 20/20 - MÉRTOLA

Foi esta a ordem: Moura, Paris, Vaticano, Bruxelas, Boston, Berlim, Nova Iorque, Worcester, Dallas, Atenas, Beja, Tunis, Bamaco, Lisboa, Tripoli, Rabat, Damasco, Madrid, Argel e Mértola.

Ficaram de fora outros sítios, importantes na minha vida profissional e no meu percurso sentimental. Poderia ter incluído o Cairo, Alepo, Lyon, Istambul, Medina Az-Zahra, Florença, Volterra...


Termino com Mértola, sítio único e especial. Com a certeza de que lá voltarei, não sei como nem quando. A minha primeira participação nas escavações data de setembro de 1983. Fui para lá viver no dia 1 de agosto de 1991. Durante 14 anos e meio, Mértola foi o meu heimat. A vila é o museu e vice-versa. Trabalhei diretamente em dois dos seus locais de exposição: a basílica paleocristã e o núcleo de arte islâmica. O Património é hoje justificado motivo de orgulho para todos nós, em Mértola. Está por fazer a história deste processo de "patrimonialização" do sítio, os sobressaltos de um percurso e aquilo que, em tempos, se disse da arqueologia. O tempo, esse grande escultor, um dia tudo clarificará. Tal como os despojos aportam à praia, depois de um naufrágio, as frases desnecessárias passarão ao esquecimento. O mesmo destino estará destinado aos seus autores. A verdade vencerá.

VERDADE

A porta da verdade estava aberta, 
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.

E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os dois meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram a um lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos. 
Era dividida em duas metades,
diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
As duas eram totalmente belas.
Mas carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

O poema é de Carlos Drummond de Andrade. A fotografia data de 2004. Terminava então a minha tese. Que foi defendida no dia 10 de junho de 2005.

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