sexta-feira, 22 de outubro de 2010

GREED

A leitura do Orçamento do Estado não é leitura que se recomende. Verlaine, ou qualquer outro poeta, é infinitamente mais interessante. Não resisto, contudo, a transcrever este artigo, para o qual um amigo, gestor financeiro, me chamou a atenção:


Artigo 88.º
Concessão extraordinária de garantias pessoais do Estado
1 - Excepcionalmente, pode o Estado conceder garantias, em 2011, nos termos da lei, para reforço da estabilidade financeira e da disponibilidade de liquidez nos mercados financeiros.
2 - O limite máximo para a autorização da concessão de garantias previsto no número anterior é de € 20 181 583 965,10 e acresce ao limite fixado no n.º 1 do artigo 77.º.
3 - Este limite é reduzido no exacto montante das operações activas que venham a ser efectuadas em 2011, ao abrigo da Lei n.º 8-A/2010, de 18 de Maio.

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Ou seja, o Governo ou, melhor dizendo, nós somos fiadores da banca. No outro dia Teixeira dos Santos falava da "insaciabilidade dos mercados". Está agora ainda mais claro aquilo a que se referia. Nós (eu e você que me lê) somos a garantia dos eventuais buracos da banca. Habituemo-nos. Ou não.


Ilustrar esta situação com a sequência final de Greed (Ganância), realizado em 1924 por Erich von Stroheim (1885-1957), parece-me conveniente. A ganância e a sede do ouro levam à morte. Embora, no caso vertente, sejamos nós a representar os dois condenados. Os abutres que não tardarão a surgir são os outros.

Vale a pena ver o filme todo, embora vos confesse que a minha memória reteve apenas esta poderosa sequência final. Vale também a pena ler um pouco sobre este filme. A rocambolesca história da sua produção, e os fragmentos de que hoje dispomos, assemelham-se um pouco ao percurso pouco linear dos benditos mercados financeiros.




1 comentário:

Anónimo disse...

Já agora acrescento esta informação: no conjunto, os 308 municípios do país vão receber 2,4 mil milhões de euros. É obra!

O art. 88.º do OE parece gritar aos bancos: gastem á vontade (em investimentos no exterior, obviamente), que nós cá estamos para salvar qualquer imprevisto se for preciso.

Já estou como o outro "saquem das naifas".